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Elsa Moura

Cultura 04.02.2025 17H19

"Maria Teresa Horta afirmou a sua identidade e das outras mulheres"

Escrito por Elsa Moura
António Ferreira, autor do programa Livros com RUM, recorda Maria Teresa Horta enquanto mulher e escritora.
Declarações de António Ferreira a propósito do desaparecimento da jornalista e escritora aos 87 anos.

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“Uma excelente escritora, uma grande poetisa com um engenho muito raro na poesia portuguesa”. É assim que António Ferreira, autor do Livros com RUM, recorda a poetisa Maria Teresa Horta, que morreu esta terça-feira, aos 87 anos. Mas a sua dimensão ultrapassa a escrita. Uma mulher que lutou pela liberdade e pela dignididade das mulheres.


Aos microfones da RUM, António Ferreira refere "uma figura muito importante na literatura portuguesa, na cultura", realçando primeiramente a luta pela "afirmação da mulher". 

"Foi uma mulher muito corajosa. Com 17 anos fez parte de um cineclube marcadamente ideológico contra o antigo regime. Teve grandes problemas, mas foi sempre uma rebelde. Desde muito jovem, Maria Teresa Horta afirmou a sua identidade de si e das outras mulheres", assinala.


A sua coragem foi sempre reconhecida dentro e fora de portas, acrescenta António Ferreira, assinalando a presença no ranking das cem mulheres da cultura mais influentes e inspiradoras do mundo. "Ela nunca hesitou naquilo que era a dignidade feminina, da sensibilidade das mulheres independentemente da área que ocupassem", acrescenta.


Jornalista, escritora, cruzou com nomes como José Saramago, ainda que a partir do grupo poesia 61 tenha iniciado a sua carreira na poesia. Com vários livros marcantes, António Ferreira destaca a obra “Minha Senhora de Mim”, uma obra de 1971. "Há um antes e um depois num certo segmento do lirismo poético feminino em Portugal e até na poesia ibérica", refere. 


António Ferreira sugere também a leitura da biografia de Maria Teresa Horta, “A desobediente”, lançada em 2024 e escrito pela jornalista Patrícia Reis. "Uma mulher, uma escritora que ficará sempre na cultura, na política, na coragem, mas acima de tudo uma excelente escritora, uma grande poetisa", resume.


"As novas cartas portuguesas", a obra banida pela ditadura


Entre outras obras, o autor do Livros com RUM faz também referência ao livro "incontornável", "«As novas cartas portuguesas», escrito com Isabel Barreto e Maria Velho da Costa.


Uma obra a partir das cartas de amor dirigidas a um oficial francês por Mariana Alcoforado, constituiu-se como um libelo contra a ideologia vigente no período pré-25 de Abril, que denunciava a guerra colonial, as opressões a que as mulheres eram sujeitas, um sistema judicial persecutório, a emigração e a violência fascista.

Começou a ser escrita em maio de 1971 e foi publicada em abril de 1972, tendo sido banida pela ditadura e as suas autoras levadas a julgamento.


O livro que se assumiu como um marco na história do feminismo, da literatura portuguesa, da oposição ao regime e da luta pela liberdade, após passar o período conturbado que envolveu a sua publicação, atravessou décadas quase como uma inexistência em Portugal, considerava, então, Maria Teresa Horta, em declarações à Lusa, acrescentando não compreender esta situação.

“Ninguém ligou nenhuma às ‘Novas Cartas Portuguesas’ em Portugal, agora, de repente, enlouquece tudo”, disse à Lusa, acrescentando: “Foram escritas há tantos anos. Depois esgotou, mas ninguém fez nada, e de repente, de súbito, de cinco em cinco minutos falam das ‘Novas Cartas’, a pessoa fica perplexa”.

Até ao fim, as três recusaram-se a revelar e ninguém conhece individualmente a autoria de cada texto, como salientou à Lusa Maria Teresa Horta, que contestava uma ideia algo difundida de que a maioria seria obra de Maria Velho da Costa.

“Foram escritas pelas três. Ninguém vai dizer [quem escreveu cada texto]. Elas já estão mortas e eu nem morta nem viva digo quem escreveu, porque nós fizemos uma jura”, afirmou, em 2022.


Frequentou a Faculdade de Letras da Universidade de Lisboa


Nascida em Lisboa em 1937, Maria Teresa Horta frequentou a Faculdade de Letras da Universidade de Lisboa, foi dirigente do ABC Cine-Clube, militante ativa nos movimentos de emancipação feminina, jornalista do jornal A Capital e dirigente da revista Mulheres.

Como escritora, estreou-se no campo da poesia em 1960, mas construiu um percurso literário composto também por romances e contos.


Com livros editados no Brasil, em França e Itália, Maria Teresa Horta foi a primeira mulher a exercer funções dirigentes no cineclubismo em Portugal e é considerada um dos expoentes do feminismo da lusofonia.


Foi amplamente premiada ao longo da sua carreira literária, destacando-se, só nos últimos anos, o Prémio Autores 2017, na categoria melhor livro de poesia, para “Anunciações”, a Medalha de Mérito Cultural com que o Ministério da Cultura a distinguiu em 2020, o Prémio Literário Casino da Póvoa que ganhou em 2021 pela obra “Estranhezas”, e a condecoração, em 2022, com o grau de Grande-Oficial da Ordem da Liberdade, pelo Presidente da República.


Cerimónias fúnebres de Maria Teresa Horta a partir de quarta-feira em Lisboa


As cerimónias fúnebres da escritora Maria Teresa Horta, que hoje morreu aos 87 anos, realizam-se na quarta-feira, partir das 18:00, na Basílica da Estrela, em Lisboa, disse à agência Lusa fonte das Publicações D. Quixote.

O velório da autora de “Minha Senhora de Mim” (1971) decorre na quarta-feira, entre as 18:00 e as 22:00, na Basílica, onde, na quinta-feira se realiza uma cerimónia, reservada à família e amigos. O funeral sai às 14:30 para o Cemitério dos Prazeres, também na capital, segundo a editora de Maria Teresa Horta.


c/Lusa

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