Regional 04.08.2020 19H34
"Nos últimos 40 anos, metade das árvores de interesse público potencial desapareceram"
As palavras são do investigador Paulo Reis Mourão, que publicou um estudo na revista científica 'Environment, Development and Sustainability', em que são abordados os desequilíbrios da valorização florestal em Portugal.
O maior volume de árvores de interesse público do país situa-se em Lisboa e não em regiões com maior densidade e diversidade florestal. Esta é uma das principais conclusões de um estudo da autoria de Paulo Reis Mourão, professor da Escola de Economia e Gestão da Universidade do Minho, e de Vítor Martinho, do Instituto Politécnico de Viseu, que foi publicado na 'Environment, Development and Sustainability', revista científica internacional sediada na Holanda.
Actualmente, o Registo Nacional do Arvoredo de Interesse Público, que está sob a reponsabilidade do Instituto da Conservação da Natureza e das Florestas (ICNF), conta com cerca de 400 árvores classificadas, sendo que um terço está localizado no distrito de Lisboa.
De acordo com Paulo Reis Mourão, as árvores catalogadas estão sobretudo dependentes da dimensão turística de cada território. “É mais fácil identificar uma árvore de interesse público quando ela está numa área já por si com uma dimensão turística acentuada, o que faz com que os próprios turistas chamem a atenção para esse foco de interesse”, explica.
Por outro lado, o investigador refere a existência de áreas, “onde, à partida, até é bem mais provável que existam árvores de interesse público potencial”, que têm “pouca densidade de residentes e de turistas”. “Estas árvores existem, mas não estão devidamente catalogadas”.
Custos de preservação repele promotores a avançarem com processo de classificação
Nas zonas com menor densidade populacional, principalmente no interior do país, segundo Paulo Reis Mourão, é “necessário haver mais atenção por parte dos promotores locais - podem ser municípios, associações ligadas à defesa do ambiente ou privados – para a importância desta matéria”.
A classificação 'arvoredo de interesse público' - bosques, arboretos, alamedas, jardins ou exemplares isolados – confere um estatuto similar de monumento nacional e com protecção legal, que pressupõe, por exemplo, uma distância de 50 metros ao seu redor. Já os critérios de selecção abrangem características como o porte, a idade, a raridade e o simbolismo.
Paulo Reis Mourão explica que os processos de classificação e, posteriormente, de preservação, afastam eventuais promotores porque “acabam por não ter capacidade para manter o espaço com as exigências que são pedidas pelo ICVF”.
“Muitas vezes não se consegue passar ao proprietário, seja público ou privado, o interesse em conservar a árvore. Ele prefere não ter a árvore classificada por causa dos custos que implica. E isso coloca em risco a própria sobrevivência da árvore”, alerta.
Distrito de Braga apresenta desequilíbrios
No caso do distrito de Braga, na lista supracitada, há 27 árvores: 12 em Guimarães, oito em Braga, três em Vila Nova de Famalicão e uma em Vila Verde, Póvoa de Lanhoso, Vieira do Minho e Celorico de Basto. A mais antiga é um carvalho-alvarinho, com 510 anos, localizado no concelho povoense, na União das Freguesias de Calvos e Frades.
Analisando o território bracarense, o investigador da Escola de Economia e Gestão fala da existência de um “desequilíbrio”. “No município de Braga, capital de distrito, temos um número expectável, mas quando olhamos para áreas como Fafe, Celorico de Basto e Cabeceiras de Basto, que têm uma densidade florestal muito maior, reparamos que há alguns espécimes que facilmente podiam ser catalogados”, refere.
Durante a elaboração do estudo, Paulo Reis Mourão e Vítor Martinho analisaram a quantidade de árvores de interesse público potencial que existiam nos anos 80, através de livros e manuais de especialidade, já que na altura ainda não havia uma classificação oficial.
Comparando com a actualidade, a redução desses elementos arbóreos foi “bastante signficativa”, de acordo com o investigador da Universidade do Minho. "Nos últimos 40 anos, metade das árvores de interesse público potencial desapareceram. Já não existem”, expõe.