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Vanessa Batista / RUM
Vanessa Batista

Academia 22.10.2021 08H00

Legalização da prostituição não pode ser porta aberta à imigração irregular

Escrito por Vanessa Batista
Juiz Jorge Martins Ribeiro, doutorado pela Escola de Direito da Universidade do Minho, foi o convidado desta quinta-feira do UMinho I&D.
Declarações do juiz Jorge Martins Ribeiro ao UMinho I&D.

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O juiz Jorge Martins Ribeiro defende a legalização da prostituição em Portugal. A premissa foi defendida na tese de doutoramento da Escola de Direito da Universidade do Minho, agora publicada em livro com o título: “Da lei do desejo ao desejo pela lei – discussão da legalização da prostituição enquanto prestação de serviço na ordem jurídica portuguesa”.


Em entrevista ao UMinho I&D, o magistrado apresentou a sua proposta para a legalização desta atividade. Desde 1963 a 1983 vigorou em Portugal o modelo proibicionista, sendo que em 1983 entrou em vigor o modelo hoje utilizado, abolicionista. Nenhum conseguiu acabar com esta prática.


Recorde-se que em 2020, deu entrada no Parlamento uma petição, que recolheu mais de 4 mil assinaturas, lançada por Ana Loureiro, com o objetivo de legalizar a prostituição. Esta proposta defende uma idade mínima para a iniciação nesta profissão (21 anos), penalização dos exploradores de menores, obrigatoriedade de exames médicos às prestadoras de serviços, descontos e regalias sociais.


Mas a proposta defendida aos microfones da Universitária pelo juiz Jorge Martins Ribeiro é bastante diferente.


[Pode ouvir a entrevista na íntegra ao UMinho I&D aqui.]



"Ninguém pode ser trabalhador sexual por conta de outrem".


A proposta de legalização de Jorge Martins Ribeiro é apresentada como um "híbrido entre o sistema regulamentador que está em vigor na Suíça, Áustria e Grécia e o legalizador dos Países Baixos, Alemanha e Nova Zelândia".


O investigador defende a legalização da atividade para mulheres, homens e transexuais a partir dos 18 anos e não aos 21, sendo também contra contratos de trabalho específicos para estes prestadores de serviços, visto que nos países que possibilitam esta opção, são residuais os trabalhadores que aderem aos mesmos. Cerca de 3% nos Países Baixos e 1% na Alemanha, segundo dados de 2004.


De sublinhar que para o magistrado, esta atividade só poderia ser exercida por cidadãos portugueses, pois a "legalização da prostituição não pode servir como porta de entrada para mais imigração irregular".


Para esta mudança será premente, de acordo com o juiz, proceder à revisão do Código Penal. Jorge Martins Ribeiro fala "em contrassenso", visto que um artigo que deveria destinar-se a garantir a autodeterminação e liberdade sexual, acaba por limitar essa prática.

"Há aqui não a proteção da liberdade sexual, e é para isso que um código penal serve, para proteger bens fundamentais de natureza pessoal, e não para defender uma qualquer concessão de moral", defende.

O magistrado pede também a redação, de um modo específico, das agravantes aos crimes. Para o juiz, neste momento essa informação é "confusa".



Modelo é contra testes obrigatórios às doenças sexualmente transmissíveis (DSTs).


O magistrado considera que a obrigatoriedade de testes às DSTs, que iria implicar um registo destes prestadores de serviços, não é uma prática aconselhada pela Organização Mundial de Saúde (OMS), nem seguida nos países que já legalizaram a prostituição, com exceção da Alemanha desde 2017. Na opinião de Jorge Martins Ribeiro esta medida pode proporcionar "uma falsa sensação de segurança", levando "a uma maior pressão para a prática de sexo desprotegido".



Estabelecimentos devem funcionar como pontos de encontro


O autor da tese “Da lei do desejo ao desejo pela lei – discussão da legalização da prostituição enquanto prestação de serviço na ordem jurídica portuguesa”, defende o fim da exploração sexual nos estabelecimentos que permitem a prostituição, visto que "parte do ganho é dividido com o dono". Outro dos pontos em que discorda da petição de Ana Loureiro.

"O que deve existir é o pagamento do aluguer do espaço", refere. Deste modo, os empresários passam a receber, apenas, as entradas no estabelecimento e vendas de bebidas.


Outra das preocupações do documento passa por criar "requisitos seletivos" para que pessoas com registo criminal por tráfico de pessoas, exploração sexual ou tráfico de estupefacientes não possam operar um negócio deste género.


Os estabelecimentos devem passar, caso a prostituição seja legalizada em Portugal, a contar com cabines de duche em todos os quartos. além disso, devem ser instalados botões de pânico para que em caso de agressão a porta seja rapidamente aberta. 



Prestadores de serviços na área do sexo podem descontar para a Segurança Social


"É totalmente demagógico dizer que querem a legalização da prostituição para pagar impostos e fazer contribuições para a Segurança Social", aponta ainda o magistrado. Segundo Jorge Martins Ribeiro, há vários anos que tal já pode ser feito. O juiz evoca o código genérico 1.519 para outros prestadores de serviços. "Podem e devem pagar os seus impostos. Não é uma atividade proibida", declara.



Porque têm os reclusos mais direitos no que toca à sexualidade do que os idosos, doentes e incapacitados?


Jorge Martins Ribeiro defende, em declarações ao UMinho I&D, a possibilidade dos idosos, doentes e incapacitados terem direito à sua sexualidade. "A sexualidade não morre antes da pessoa", afirma.

Nos Países Baixos e na Dinamarca, este serviço junto de lares, a título de exemplo, é considerado como cuidado de saúde.

"Torna-se injusto porque a sexualidade dos reclusos há anos que está prevista na lei, não me parece que os reclusos tenham mais direitos ao cumprimento da sua vida sexual que outras pessoas que não estão presas", alerta.



Profilaxias pré e pós-exposição ao HIV ainda à espera de decisão do Infarmed.


No final da entrevista ao UMinho I&DJorge Martins Ribeiro, deixou duras críticas ao Infarmed, visto que passados cinco anos, ainda não foi concluída a avaliação da relação do custo benefício das profilaxias pré e pós-exposição ao HIV (aprovadas pela Agência Europeia do Medicamento em 2016 e comercializadas em vários países).


"Portugal tem a mais alta taxa de pessoas infetadas na Europa Ocidental. A prevalência de DSTs entre pessoas que se prostituem também estamos nos mapas vermelhos quer do programa da ONU quer da OMS", logo esta questão não pode, no seu entender, continuar pendente.

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