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Redação

Academia 31.03.2023 10H21

Quando se tornou ministra, Elvira Fortunato pediu a Bruxelas para manter bolsa

Escrito por Redação
Ao aceitar o convite para o Governo de António Costa, em 2022, Elvira Fortunado perdeu o direito à bolsa de €3,5 milhões do Conselho Europeu de Investigação (ERC) que ganhara em 2018. 

Ao aceitar o convite para o Governo de António Costa, em 2022, Elvira Fortunado perdeu o direito à bolsa de €3,5 milhões do Conselho Europeu de Investigação (ERC) que ganhara em 2018. No entanto, a ministra da Ciência e Ensino Superior tentou que o financiamento europeu e o projeto científico na Faculdade de Ciências e Tecnologia da Universidade Nova de Lisboa (FCT-UNL) que queria desenvolver com essas verbas não fossem interrompidos, procurando mesmo a intervenção da Comissão Europeia. As regras do ERC são, porém, claras: a bolsa atribuída a um cientista é nominal e não pode ser transferida para outro. Os investigadores podem mudar de universidade sem perder o direito às verbas europeias, o que não podem é mantê-las se forem para um Governo. Só que o pedido esbarrou na comissária com a pasta da Inovação, Investigação, Cultura, Educação e Juventude.

Ao que o Expresso apurou, Mariya Gabriel nem sequer respondeu ao e-mail enviado por Elvira Fortunato, recusando envolver-se na atribuição de bolsas por parte do ERC, dossiê sobre o qual não tem competências. Este pedido foi feito também com o conhecimento de Maria Leptin, que lidera o ERC.


A representação de Portugal junto das instituições europeias (REPER) confirma que “teve conhecimento de que a prof.ª Elvira Fortunato abordou a Comissão Europeia sobre a possibilidade de alteração do investigador responsável do projeto financiado pela referida bolsa ERC”, acrescentando que “o pedido não teve acolhimento” por parte do executivo comunitário.

O pedido sensível ficava assim nas mãos do Conselho Europeu de Investigação.


O Expresso questionou o gabinete da ministra sobre este processo e que tentativas tinham sido feitas para que o apoio fosse mantido até ao final. Sem detalhar, o gabinete de Elvira Fortunato responde que foi contactada a “entidade responsável”: “O grupo de investigação que dirigia [Cenimat — Centro de Investigação de Materiais do Laboratório Associado i3N] não era unipessoal, é uma grande equipa, que tem excelentes investigadores, que continuaram de forma exemplar as várias áreas de investigação do laboratório.” Na mesma resposta enviada ao Expresso é ainda assegurado que “Elvira Fortunato seguiu escrupulosamente os procedimentos legais a que estava obrigada”. “Mesmo antes de ter tomado a decisão de aceitar fazer parte do Governo, a investigadora solicitou orientações à ERC Executive Agency (ERCEA) no sentido de saber como proceder, assegurando que os regulamentos relativos a este tipo de financiamento fossem cumpridos. De igual forma estava em causa a contratação de investigadores, assim como a amortização relativa à compra de um grande equipamento no valor de €2 milhões (um microscópio de transmissão de elevada resolução). Os contactos com a ERCEA começaram a 10 de março”, relata o gabinete da ministra. O anúncio de que a investigadora tinha sido nomeada ministra aconteceu a 23 de março.


O Conselho Europeu de Investigação confirma que “quando [Elvira Fortunato] foi nomeada ministra, a Universidade Nova de Lisboa informou o ERC sobre a nova situação e o facto de não poder continuar a dedicar-se ao projeto” científico. Sem Fortunato na investigação, a direção do ERC “decidiu pôr termo à subvenção”. No entanto, o organismo europeu não suspendeu logo o financiamento do projeto científico, optando pela descontinuação (phasing out) até final de 2022, reduzindo-o em um ano. “Foram tidos em consideração os membros da equipa que estavam envolvidos no projeto e o laboratório que dependia do financiamento do ERC”, diz fonte do ERC, sublinhado, porém, que “nenhum pagamento” foi feito diretamente a Elvira Fortunato durante esse período e até à conclusão do projeto, no final do ano passado. “O ERC comunica o início do phasing out a 1 de abril de 2022, tendo conhecimento pleno de que a tomada de posse ocorreu a 30 de março do mesmo ano”, relata o ministério, lembrando que esta solução de descontinuidade “aconteceu em situações da mesma natureza com outros investigadores que não tiveram possibilidade de terminar um projeto”.


Questionado sobre este processo, o ERC admite que “recebeu um pedido da prof.ª Fortunato” para que fossem “exploradas diferentes opções sobre a gestão da bolsa”, mas rejeita que a ministra tenha pedido a transferência da bolsa para outro investigador, “uma vez que isso não é possível”. A presidente do ERC considerou mesmo o pedido “normal”, argumentando que qualquer “investigador responsável faria tudo o que estivesse ao seu alcance para cuidar do projeto e dos investigadores que o executam”. Nas respostas ao Expresso, a REPER refere, no entanto, que a possibilidade de alterar o investigador responsável pelo projeto financiado pela bolsa foi “abordada” junto da Comissão Europeia. 


O financiamento deveria ir de janeiro de 2019 até ao final de 2023, podendo chegar aos €3,5 milhões. Com o fim antecipado, as transferências para a UNL ficaram nos €2,87 milhões. Esta bolsa foi a maior de sempre atribuída até então a um investigador português e a maior atribuída pelo Conselho Europeu de Investigação naquele concurso, ao qual concorreram mais de 2160 investigadores a nível mundial, segundo o comunicado de imprensa divulgado na altura pela FCT/UNL. Para Elvira Fortunato, então diretora do Cenimat, foi a segunda advanced grant (subvenção avançada) conquistada, desta vez com o projeto Multifunctional Digital Materials Platform for Smart Integrated Applications. O Cenimat é atualmente coordenado por Rodrigo Martins, professor da FCT e um dos inventores da chamada eletrónica de papel, investigação que desenvolveu conjuntamente com Elvira Fortunato, sua mulher. 


C/Expresso

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